|
Hino ao Nada que Fui e Serei
Ato I - A Fotossíntese Degolada
Nos últimos estertores do sol, quando a lua não mais refletir o seu brilho e tornar-se escura como o interior inexpugnável dos buracos negros, eu estarei lá.
Nos confins das eras infinitas, onde o tempo não tem sentido e a existência da vida for só uma migalha insignificante e esquecida, eu estarei lá.
Quando a última folha verde da tênue esfera azul ressecar-se e esfacelar-se completamente e a fotossíntese for degolada pela escuridão da alvorada, eu estarei lá.
Ato II - O Martelo do Esquecimento
Na madrugada estranha, no momento em que a última inteligência artificial for silenciada, e o "bit" final pulsar para o apagamento total, eu estarei lá.
No silenciar do uivo do Lobo terminal, quando o seu hálito quente emitir o som final, e congelar-se no pico gelado da montanha fatal, eu estarei lá, em minha essência animal.
No derradeiro dia de nossa espécie, quando o último neohumano sucumbir à natural entropia da existência, e o cosmos - em silenciosa condolência - bater com o martelo do esquecimento o último prego no caixão astral de nossa pretensiosa esperança de eternidade, eu estarei lá!
Ato III - A Morte Caudalosa
Quando todos os pretensos legados, as medalhas e os afagos, os amores e os detratores de todos os seres em processo de extinção, tentarem permanecer agarrando-se aos fios frágeis do tempo impiedoso, eu estarei lá.
Na hora inevitável da minha morte caudalosa, quando alguns poucos lamentarem, outros tantos comentarem e ainda outros gargalharem, eu estarei lá, impassível, indomável, irascível.
Quando nenhuma esperança, nenhuma fé e nenhuma lembrança abalarem a glória da vontade no jardim mágikco do agora, eu estarei lá, sugando o suprassumo do tudo e lambendo as feridas do nada.
Eu sempre nunca estarei lá.
Lá.
Aqui.
(Ciberpajé)
|